
Hello, People!
Como é bom sentir que a aridez trazida pela dor começa a sofrer transformações! Como é bom sentir que o solo árido começa a se tornar terra fértil, germinando flores! É um processo mágico, quase alquímico, da alma e do corpo.
Transformando dores em flores...talvez esse seja o título mais propício para me descrever nesse exato momento da minha vida. Não, hoje não falo das dores, porque elas já foram descritas (esforço hercúleo descrever o indescritível). Quero falar das flores que começam a desabrochar em minha alma, ou seja, o que me traz de novo a recuperação.
Há dois dias venho me testando. É claro que faço isso a partir da leitura que tenho do meu próprio corpo, de entender quais são as minhas possibilidades e como posso lidar com elas. Resolvi caminhar. Isso mesmo: caminhar, literalmente. Não uma caminhada no sentido do exercício físico, mas para testar a minha própria potência. Aqui peço licença a vocês, leitores queridos, para falar sobre um conceito do filósofo Friedrich Wilhelm Nietzsche que perpassa todo esse processo de entendimento de dor e vida. Trata-se da vontade de potência: de modo simples (se é que é possível, porque Nietzsche é apaixonantemente denso), é a vontade de transcender os limites, de triunfar sobre o nada, de vencer o aniquilamento, de tecer a vida a partir de fios delicados, finos, mas fortes. É uma vontade de ultrapassar os próprios instintos. Numa palavra: um impulso de vida (Eros em oposição a Tanatos).
Dito isso, queria ver como andava o nosso relacionamento - entre a prótese e eu - porque esse trabalho de integração é "hard" , pois envolve corpo e o psiquismo (expresso, em parte, por "vontade de potência", mobilizando também mecanismos "psis" mais complexos). Assim, caminhei num espaço seguro, longe do movimento de carros, trânsito e até mesmo de pessoas...um espaço livre, que não me oferecesse risco. Será que alguém pode fazer ideia do que significa andar sem dor para quem não podia dar alguns passos sem ela? Intraduzível, sob todos os aspectos. Pois é, andei! Ainda auxiliada por uma das muletas, mas andei durante minutos...sem dor! Quando poderia imaginar isso antes da cirurgia? Ah! Foi deliciosamente delicioso, com a licença do pleonasmo. E mais: o dia estava lindo e parece que podia sentir o sol incidindo sobre a pele, células, ossos e alma (tive a impressão de ter realizado a fotossíntese e de ter produzido clorofila). Não tinha a dimensão do quanto precisava do sol, embora o tangenciasse em casa, sem me expor prolongadamente. Senti uma luminosidade, uma alegria intensa, como uma porta que se abria para o novo. Redescobrir a vida é mesmo alquímico. Foi aí que senti as flores brotarem de um solo mais fértil, mais forte, exalando uma fragrância suave. Foi muito importante para mim perceber esse campo anímico. Já posso transitar por ele, descalça, passos leves, suaves, deliciando-me na relva mais verdejante, sentindo o perfume das flores e o ceu de um azul resplandecente. Assim passei a configurar a minha alma, desfrutando também a sombra da frondosa árvore da esperança e bebendo a água da fé.
Nesse processo de reabilitação não tive medo tocar o chão, ainda que com a ponta do pé, de saber quem é essa que agora habita em mim - a prótese - a que veio, do que ela era capaz, mas no maior respeito e cuidado, sem abusar! Não saía do âmbito das orientações médicas e isso é importante destacar. Trocando em miúdos, queria buscar entender quem é ela, como funciona. É como se estivéssemos num processo de paixão, de conhecimento de alguém (mal comparando), e buscássemos saber quem é, como vive, o que gosta, comida predileta, perfume favorito, gostos intelectuais e artísticos e trocentas coisas que só nos permitimos de fato nesse estado de (quase) beatitude (não vou dizer que tais interrogações sejam tolas, afinal, fazem parte do processo de quem se apaixona).
Sofrer um acidente não é fácil...pior ainda é lidar com as sequelas. Mas creio que a grande mágica, a grande alquimia que a vida nos oferta é saber transformar essas dores em flores. É, indubitavelmente, um momento mágico. Revela que conseguimos sobreviver aos escombros. Mais ainda: mostra que, usando a vontade de potência (inerente a todo e qualquer ser humano, no entender de Nietzsche), podemos reconstruir a vida e nos valer até da tanscendência, a despeito das dificuldades e do imponderável. NÃO É FÁCIL! É dolorosamente difícil, mas exige coragem, toneladas de coragem, de paciência, mas também de ousadia, criatividade e fé. E eu, que ainda estou aprendendo a criá-las, posso resumir assim o meu processo: "E eu que não sei quase nada do mar/Descobri que não sei nada de mim"(letra de "Eu que não sei quase nada do mar", de Ana Carolina e Jorge Vercilo, na voz inconfundível de Maria Bethânia).
Sofrer um acidente não é fácil...pior ainda é lidar com as sequelas. Mas creio que a grande mágica, a grande alquimia que a vida nos oferta é saber transformar essas dores em flores. É, indubitavelmente, um momento mágico. Revela que conseguimos sobreviver aos escombros. Mais ainda: mostra que, usando a vontade de potência (inerente a todo e qualquer ser humano, no entender de Nietzsche), podemos reconstruir a vida e nos valer até da tanscendência, a despeito das dificuldades e do imponderável. NÃO É FÁCIL! É dolorosamente difícil, mas exige coragem, toneladas de coragem, de paciência, mas também de ousadia, criatividade e fé. E eu, que ainda estou aprendendo a criá-las, posso resumir assim o meu processo: "E eu que não sei quase nada do mar/Descobri que não sei nada de mim"(letra de "Eu que não sei quase nada do mar", de Ana Carolina e Jorge Vercilo, na voz inconfundível de Maria Bethânia).
Para terminar, mais um pouco de Nietzsche: "Um pequeno obstáculo é suplantado, mas imdediatamente segue-se outro que também é suplantado - esse jogo de resistências e vitórias estima ao máximo o sentimento geral de potência (...)" (p. 248).
Beijos!
In: NIETZSCHE, Friedrich. Vontade de Potência. RJ: Ediouro. [s.d.].
Beijos!
In: NIETZSCHE, Friedrich. Vontade de Potência. RJ: Ediouro. [s.d.].
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